Após mais de um ano sem resposta sobre laudos técnicos, entidade ambiental questiona arquivamento de inquérito e diz que vai entrar na Justiça
Itajaí/Porto Belo (SC) – Passados mais de doze meses desde o primeiro pedido formal de informações, a ONG Olho Vivo afirma que o Ministério Público Federal (MPF), por meio do 1º Ofício da Procuradoria da República em Itajaí, ainda não apresentou à entidade documentos técnicos que comprovem a efetiva despoluição da Lagoa do Perequê e de seu canal, conforme previsto no item 10 da Cláusula 3 do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado no âmbito do Inquérito Civil nº 1.33.008.000033/2010-63.
A controvérsia envolve a execução das obrigações ambientais assumidas como contrapartida à implantação de empreendimento no entorno do Parque Natural Municipal da Lagoa do Perequê, em Porto Belo (SC). Segundo a ONG, embora o MPF sustente que o TAC foi integralmente cumprido — com base em declarações da Fundação Municipal do Meio Ambiente de Porto Belo (FAMAP) e em termos de aceite administrativos — não há, nos autos do procedimento, laudo técnico conclusivo que ateste a despoluição da lagoa e de seu canal, nem documentação clara sobre a destinação final dos resíduos sólidos eventualmente oriundos de dragagem.
Um ano de ofícios sem respostas objetivas
Em 21 de novembro de 2024, a ONG Olho Vivo protocolou o Ofício nº 110/2024 junto ao MPF em Itajaí, solicitando informações objetivas sobre dois pontos centrais do TAC:
– o local de destinação final do material sólido oriundo da dragagem da Lagoa do Perequê e de seu canal;
– a existência de estudos técnicos comprobatórios da efetiva despoluição da lagoa e do canal.
Arquivamento baseado em declarações administrativas
Sem obter resposta dentro do prazo legal, a entidade reiterou o pedido por meio do Ofício nº 003/2025, datado de 20 de janeiro de 2025, destacando que havia sido informada, em comunicação de 25 de novembro de 2024, de que as respostas seriam prestadas em até dez dias — o que não ocorreu.
Como resposta, o MPF informou que o TAC havia sido arquivado com base em declaração da Fundação Municipal do Meio Ambiente de Porto Belo (FAMAP), segundo a qual todas as obrigações pactuadas teriam sido cumpridas. Também foi concedido acesso integral aos autos do Inquérito Civil.
Após análise minuciosa da documentação, a ONG Olho Vivo sustenta que não encontrou nenhum laudo técnico ambiental que atestasse, de forma científica, a despoluição da Lagoa do Perequê, nem relatório conclusivo sobre a destinação ambientalmente adequada dos resíduos da dragagem. Para a entidade, em relação ao cumprimento do item 10 da Cláusula 3ª, não existe comprovação de cumprimento. Constam apenas afirmações genéricas de cumprimento do TAC, desacompanhadas das comprovações técnicas exigidas pelo próprio conteúdo do acordo.
Novo ofício e silêncio prolongado
Diante da persistência das lacunas, a ONG enviou novo requerimento ao MPF em 17 de março de 2025, por meio do Ofício nº 011/2025, reiterando a inexistência de comprovação técnica do cumprimento integral do item 10 da Cláusula 3ª do TAC. Segundo a entidade, nem mesmo o próprio MPF teria conseguido indicar, naquele momento, a existência do laudo de despoluição exigido.
A partir desse ofício, seguiu-se, conforme relata a ONG Olho Vivo, um período de oito meses sem qualquer resposta formal do órgão ministerial, apesar de se tratar de informações amparadas pela Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011).
Pedido de embargo e indeferimento
Em 3 de novembro de 2025, diante do prolongado silêncio institucional e da ausência de comprovação técnica do cumprimento do TAC, a ONG Olho Vivo encaminhou o Ofício nº 085/2025, solicitando medidas mais incisivas. Entre elas:
1. a reabertura imediata do Inquérito Civil nº 1.33.008.000033/2010-63;
2. o embargo ambiental preventivo do empreendimento Lagom Perequê, até a apresentação e validação de laudos de dragagem, relatórios de destinação de resíduos e comprovação da despoluição;
3. a realização de perícia técnica independente, a cargo do IBAMA ou outro órgão federal;
4. a suspensão de licenças e autorizações ambientais concedidas ao empreendimento;
5. a adoção de medidas cautelares e fiscalizatórias urgentes no entorno da lagoa.
Sem manifestação formal após um mês, o presidente da ONG Olho Vivo entrou em contato telefônico com o 1º Ofício do MPF em 13 de dezembro de 2025, informando que a entidade pretendia ajuizar Ação Civil Pública diante da situação. Poucos dias depois, em 17 de dezembro, o MPF encaminhou despacho indeferindo o pedido de embargo e afirmando que a alegação de descumprimento do TAC apresentada pela ONG seria “genérica”.
Para a entidade, o indeferimento é contraditório, pois o próprio MPF não apresentou qualquer laudo técnico que contradissesse as alegações da ONG.
Crítica da ONG – ausência de provas técnicas: “Quando se fala em laudo, a engrenagem trava”
Para a ONG Olho Vivo, o cerne do problema permanece intocado: a inexistência de prova técnica inequívoca de que a Lagoa do Perequê e seu canal foram efetivamente despoluídos.
A ONG entende que a caracterização de sua denúncia como “genérica” é contraditória, uma vez que o próprio indeferimento não veio acompanhado de laudos técnicos, pareceres ambientais conclusivos ou documentos que comprovem, de forma inequívoca, a efetiva despoluição da Lagoa do Perequê e de seu canal.
“O MPF afirmou que nossa denúncia é genérica, mas esqueceu de mencionar que a comprovação do cumprimento do TAC também o é: Não há laudo, não há análise laboratorial, não há comprovação de destinação final dos resíduos. Isso não é genérico, é omissão”, complementou o presidente.
“A engrenagem funciona normalmente até o momento em que se fala em laudo de despoluição. A partir daí, tudo trava — e não há graxa de lítio ou outro material que faça destravar”, afirmou o presidente da entidade a uma assessora do MPF, em declaração que sintetiza a insatisfação da ONG com o tratamento dado ao caso.
Segundo a Olho Vivo, mais de um ano após o primeiro ofício, o MPF continua a se basear em afirmações genéricas de cumprimento integral do TAC, sem enfrentar objetivamente os questionamentos centrais da sociedade civil organizada.
Próximos passos anunciados
Diante do impasse, a ONG Olho Vivo informa que pretende:
– ajuizar Ação Civil Pública para discutir o cumprimento do TAC;
– oficiar o Ministério da Justiça, solicitando apoio institucional, inclusive da Polícia Federal, para apurar outras situações não afeitas à área ambiental;
– provocar a atuação do IBAMA e de outros órgãos federais competentes;
– adotar outras medidas administrativas e judiciais que entender cabíveis.
Para a entidade, o caso da Lagoa do Perequê extrapola uma disputa burocrática e toca no cerne do controle social das políticas ambientais. “Respostas precisam ser dadas”, sustenta a ONG, que afirma não considerar o TAC integralmente cumprido enquanto não houver comprovação técnica clara, transparente e acessível à sociedade sobre a efetiva recuperação ambiental da lagoa e de seu canal: “A sociedade tem o direito de saber se um dos principais ecossistemas lacunares da região foi, de fato, recuperado ou apenas declarado como tal em documentos administrativos sem lastro técnico”, afirmou a entidade
Elias Costa Tenório
Presidente – ONG OLHO VIVO
Defendendo a Soberania e a Ética Pública
Email: ongolhovivobrasil@gmail.com
Site: www.olhovivobr.org




