BIGUAÇU: ONG QUE COMBATE CORRUPÇÃO PEDE INVESTIGAÇÃO SOBRE “VAZAMENTO” DE ATESTADO DE VEREADORA PARA A IMPRENSA

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Imprensa local publicou Atestado Médico contendo a Classificação Internacional de Doenças (CID), da paciente, o que é vedado pelas normas médicas e pela Constituição Brasileira

ENTENDA O CASO

No dia 13 de agosto, foi publicado na COLUNA DO DÉCIO, no veículo de comunicação JORNAIS EM FOCO, uma matéria que expos publicamente o Atestado Médico da vereadora Salete Orlandina Cardoso.

                        No mesmo dia, no veículo de comunicação Biguá News, na coluna sobre Política, foi publicado uma matéria onde também se verifica a exposição pública do Atestado Médico da referida vereadora.

                        “Ocorre que, o Atestado Médico da vereadora foi entregue UNICAMENTE para a MESA DIRETORA da Câmara de Vereadores de Biguaçu, para justificar afastamento temporário, e também cabe ressaltar que, no referido Atestado, consta a Classificação Internacional de Doenças (CID), e sua ampla divulgação na mídia pode violar as garantias constitucionais como o direito à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem”, segundo mencionou para a Folha do Estado um dos diretores da ONG Olho Vivo (Organização do Voluntariado para Combate à Corrupção, Defesa dos Direitos Humanos e Ambientais).

                        Em ofício encaminhado para a Delegacia de Polícia de Biguaçu, a entidade menciona que, “Atestado Médico refere-se exclusivamente a pessoa humana e não ao político. Não existe problema em se mencionar afastamento e seu motivo, mas divulgar o Atestado com a CID é algo que em nosso entendimento fere a dignidade humana e foge de qualquer outro escopo”.

                        A ONG Olho Vivo também mencionou no ofício algumas Resoluções do Conselho Federal de Medicina que tratam sobre o tema:

  • Resolução CFM nº 1.819/2007 proíbe “o preenchimento, nas guias de consulta e solicitação de exames das operadoras de planos de saúde, dos campos referentes à Classificação Internacional de Doenças (CID) e tempo de doença concomitantemente com qualquer outro tipo de identificação do paciente ou qualquer outra informação sobre o diagnóstico, haja vista que o sigilo na relação médico-paciente é um direito inalienável do paciente, cabendo ao médico a sua proteção e guarda”. A exceção são os casos previstos em lei. 
  • Já a Resolução CFM nº 1.851/2008 diz que o médico deve “estabelecer o diagnóstico, quando expressamente autorizado pelo paciente”. Diz ainda que, no caso de atestado para perícia médica, o médico “deverá observar o diagnóstico”.
  • Parecer Consulta nº 161.037/2012, por sua vez, aponta que “excetuando-se as situações já previstas no Código de Ética Médica de obrigação legal (doenças de notificação compulsória) ou justa causa (quando a integridade da saúde e a vida de terceiros correrem perigo), o médico está obrigado ao sigilo quanto ao conhecimento dos agravos à saúde de seu paciente”.

           A entidade também mencionou outros aspectos legais e morais relativos ao sigilo médico-paciente:

                    “Já o dever legal diz respeito ao dever previsto em norma jurídica, que independe da vontade do paciente. Um dever, por exemplo, é o de informar sobre doenças contagiosas que devem ser compulsoriamente notificadas. O médico que quebrar o sigilo por conta de uma ordem legal também não é punido.

                        Por outro lado, não existe determinação legal que obrigue o médico a quebrar o sigilo por solicitação de autoridades policiais. Mesmo nos casos em que o juiz solicitar acesso a informações, não há consenso. A recomendação, nesses casos, é que o médico compareça ao local indicado para o depoimento, mas que alegue que, pelo dever da profissão, não pode quebrar o sigilo médico sem que seja autorizado pelo paciente.         

                        A preservação destas informações tem razões morais, mas não apenas isso. Também está prevista em diversas normas legais e éticas, como mencionamos no início do texto. Mas vale dizer também que a Constituição Federal de 1988 determina que a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas são invioláveis.

                        Da mesma forma, o Código de Ética Médica tem um capítulo que trata sobre o tema, proibindo que o médico revele informações obtidas no exercício da profissão, exceto por dever legal, motivo justo ou autorização do paciente. A proibição é válida, inclusive, para pacientes falecidos.    

Agora imagine sua ampla divulgação na mídia.

                        No caso em voga, tem-se que, mesmo tendo sido feita a inserção da CID no Atestado Médico com a autorização da paciente, o referido Atestado, como mencionamos, foi entregue UNICAMENTE para Mesa Diretora da Câmara Municipal de Biguaçu e, posteriormente foi “VAZADO” para a imprensa local, provavelmente por algum servidor ou mesmo vereador do Legislativo de Biguaçu”.

                        A ONG finalizou o ofício solicitando o que segue:

                        “Ante ao exposto, REQUER esta entidade que, V.Sa. se digne a acatar o presente Oficio e, se assim entender, proceder a abertura de procedimento investigatório competente para apurar as responsabilidades em relação ao “vazamento” do Atestado Médico da vereadora Salete Orlandina Cardoso, para a imprensa local, bem como, também investigar a publicação por parte dos referidos veículos de comunicação e seus responsáveis diretos; não somente em relação a responsabilização futura pela publicação, mas principalmente, em relação a “fonte” que originou a entrega do Atestado para ser publicado, posto que, na hipótese de possível cometimento de crimes ou mesmo concorrência para cometimento de crimes, a imprensa não tem cobertura legal para invocar o “sigilo da “fonte”, solicitou a Olho Vivo.

                        O ofício é assinado pelo Presidente da entidade, jornalista José Avelino de Santana Neto.

                        Em relação a essa última fala da entidade no ofício, nós, como somos imprensa, questionamos o entendimento da ONG sobre o sigilo da fonte jornalística, e recebemos a seguinte resposta do jornalista e membro cofundador da entidade, Elias Costa Tenório:

                        “O Art. 5º da Constituição Federal é, em nosso entendimento, auto-explicativo: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XIV – e assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; – grifamos-.

                        No caso em voga, não entendemos que se é necessário o sigilo ao exercício profissional, pois a divulgação de Atestado Médico contendo a Classificação Internacional de Doenças (CID), fere diretamente a própria Constituição Federal em relação a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas que, segundo a Constituição Brasileira, são invioláveis.

                        Essa menção de INVIOLABILIDADE deixa claro sua inquestionabilidade, ou seja, é Cláusula Pétrea.

                        Portanto, resta claro que ninguém pode tentar se escudar em um artigo da Constituição para ferir outro, notadamente em se tratando da dignidade humana, que até mesmo a Organização das Nações Unidas menciona em Tratados e Convenções Internacionais, e mesmo na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aos quais o Brasil é signatário.

                        Por outro Norte, a lição do Ministro Celso de Mello, no julgamento do Inq. 870-02/RJ, Relator Ministro Celso de Mello, DJU de 15 de abril de 1996, quando disse que o sigilo da fonte corrobora uma “garantia de ordem jurídica que, outorgada a qualquer jornalista em decorrência de sua atividade profissional, destina-se, em última análise, a viabilizar, em favor da própria coletividade, a ampla pesquisa dos fatos ou eventos cuja revelação se impõe como consequência ditada por razões de estrito interesse público(…). Isso claramente significa que a prerrogativa concernente ao sigilo da fonte, longe de qualificar-se como mero privilégio de ordem pessoal ou estamental, configura, na realidade, meio essencial de concretização do direito constitucional de informar, revelando-se oponível, em consequência, a quaisquer órgãos ou autoridades do Poder Público, não importando a esfera em que se situe a atuação institucional dos agentes estatais interessados”.

                        Disse ainda o Ministro Celso de Mello, naquela decisão que, “a proteção constitucional que confere ao jornalista o direito de não proceder a disclosure da fonte de informação ou de não revelar a pessoa de seu informante desautoriza qualquer medida tendente a pressionar ou a constranger o profissional de imprensas a indicar a origem das informações a que teve acesso.”

                        Portanto, os jornalistas assim agindo, no exercício legítimo de uma prerrogativa constitucional, não podem sofrer qualquer sanção penal, civil ou administrativa, e esse é também nosso entendimento.

                        No entanto, no caso em voga, resta claro que, não há como se alegar que exista os fatos mencionados pelo Eminente Ministro Celso de Mello, como, por exemplo, fatos ou eventos cuja revelação se impõe como consequência ditada por razões de estrito interesse público”, posto que não existe, em nosso entendimento, nenhum interesse público em saber a Classificação Internacional de Doenças (CID) do atestado da vereadora.  Bastava se mencionar que ela havia apresentado Atestado Médico para se afastar, até se poderia mencionar a especialidade do médico que deu o aludido Atestado, ou seja, havia outros meios para informar o afastamento da vereadora e manter o interesse público na informação sem ferir a Constituição.

                        Somente para exemplificar, nem mesmo a publicação do Atestado Médico sem que constasse a CID seria admissível, pois em nosso entendimento, foge do escopo do interesse público.

                        Entendemos, portanto, que neste caso específico, os veículos de comunicação que publicaram o Atestado Médico com a CID da paciente, não podem alegar que estavam agindo no exercício legítimo de uma prerrogativa constitucional, ao contrário, entendemos que feriu Cláusula Pétrea da Constituição.

                        Mas, notem que, aos agentes ou agente da Câmara Municipal que vazou o documento para ser publicado na imprensa, a estes ou este, nem caberá se alegar exercício profissional”, finalizou o jornalista.